Ainda que negue, Paes é a aposta lulista para o governo estadual. O trunfo do bolsonarismo é sua forte presença nas prefeituras. O apoio do centrão é crucial, mas a consolidação de federações partidárias e negociações via emendas parlamentares também serão determinantes 4w2r2c
por Mayra Goulart, em Outras Palavras
As articulações políticas para as eleições estaduais de 2026 no Rio de Janeiro já estão em pleno vapor, impulsionadas pelos resultados das eleições municipais de 2024. A nova configuração do poder local redesenha o mapa das forças políticas no estado, com implicações diretas sobre as possibilidades de candidaturas ao governo estadual. Ao analisar os atores relevantes e as possíveis alianças, é essencial considerar a distribuição regional do poder político, os prefeitos reeleitos, os deputados mais votados e as articulações entre partidos e grupos de interesse.
Em artigo anterior publicado na véspera da eleição de 2024, argumentamos que a eleição para governador em 2026 poderia vir a ser uma batalha entre três grandes campos políticos1:
(1) o campo lulista, que gostaria de ter como seu candidato o prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD) — embora ele negue, até o momento, essa intenção;
(2) o campo do atual governador Claudio Castro (PL), que poderia ter como candidato o deputado federal Dr. Luizinho (PP);
(3) e o campo liderado pelo presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar (União Brasil).
A política, no entanto, não se desenvolve num campo asséptico e está sempre sujeita a reviravoltas. Sem que ninguém vislumbrasse essa possibilidade, uma denúncia grave envolvendo o sistema de saúde do estado atingiu em cheio a pré-candidatura de Dr. Luizinho no fim de 2024. Além disso, Bacellar se recompôs com Castro e o PP de Dr. Luizinho estabeleceu uma federação com o União Brasil de Bacellar. Ou seja, de uma tendência de três campos principais para a disputa em 2026, temos agora apenas dois campos: o lulista em torno de Paes e o bolsonarista com Bacellar.
Na Região Metropolitana, destaca-se a figura de Eduardo Paes (PSD), reeleito prefeito da capital com mais de 60% dos votos. Apesar de negar uma candidatura ao governo estadual, seu nome é o mais competitivo no campo progressista. Paes articula uma ampla frente democrática com apoio do PSD nacional e do presidente Lula, configurando um polo de centro com força nas áreas urbanas. Em São Gonçalo, a reeleição de Capitão Nelson (PL) com mais de 80% demonstra a força do bolsonarismo. Já em Niterói, Rodrigo Neves (PDT) mantém influência como possível articulador do campo progressista fora da capital. A Baixada Fluminense permanece como reduto conservador, com figuras como Márcio Canella (União Brasil) e Altineu Côrtes (PL) exercendo forte influência local.
No Noroeste Fluminense, prefeitos como Nel (PL), em Itaperuna, e Alessandra (Republicanos), em Miracema, consolidam a hegemonia da direita na região. O deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL), presidente da Alerj, tem base consolidada nessa região e desponta como pré-candidato ao governo com apoio de setores conservadores e do grupo do governador Cláudio Castro. Sua articulação com Thiago Pampolha (MDB), atual vice-governador, pode resultar em uma chapa competitiva da direita. Já o Norte Fluminense é dominado politicamente por Wladimir Garotinho (PP), reeleito em Campos dos Goytacazes, que mantém o legado político da família Garotinho. Em Macaé, Welberth Rezende (Cidadania), com alta votação, pode se tornar ator relevante na configuração do campo progressista.
As Baixadas Litorâneas reforçam o domínio do PL, e da direita, com Dr. Serginho e Marcelo Magno sendo reeleitos com larga vantagem em Cabo Frio e Arraial do Cabo. A atuação legislativa de Dr. Serginho na Alerj, antes de se tornar prefeito, o posiciona como articulador regional deste campo. A Região Serrana segue alinhada ao campo conservador, com Hingo Hammes (PP) e Johnny Maycon (PL) reeleitos em Petrópolis e Nova Friburgo. Giselle Monteiro (PL) representa a região na Alerj com base consolidada. No Centro-Sul, os prefeitos Joa (Republicanos) em Três Rios e Júlio Canelinha (União Brasil) em Paraíba do Sul mantêm a linha conservadora, embora abertos a alianças pragmáticas.
O Médio Paraíba, com Neto (PP) em Volta Redonda e Luiz Furlani (PL) em Barra Mansa, mostram predominância do centrão e direita tradicional de expressão marcadamente fisiológica. Essa região pode pender para uma candidatura apoiada por partidos como MDB e PP, legendas que atuam mais como balcão de negócios do que como organizadores de preferências ideológicas. A Costa Verde apresenta um quadro misto: Cláudio Ferreti (MDB) em Angra dos Reis atua no campo de centro, enquanto Zezé Porto (Republicanos) em Paraty assume um discurso mais ideologizado. Thiago Pampolha, com base no MDB e forte influência no Sul Fluminense, pode reunir apoio nessa região.
Entre os deputados estaduais e federais, destaca-se a presença de parlamentares como Rodrigo Bacellar (PL), Daniela do Waguinho (União Brasil), Dr. Serginho (PL) e Altineu Côrtes (PL), todos com atuação relevante em suas regiões. No campo progressista, os deputados federais Talíria Petrone (PSOL), Tarcísio Motta (PSOL), Lindbergh Farias (PT) e as estaduais Renata Souza (PSOL) e Elika Takimoto (PT) mantêm base sólida na capital, especialmente nas zonas norte e oeste, as mais expressivas eleitoralmente. A atuação dessas lideranças será decisiva na composição das alianças e na mobilização territorial.
A consolidação das federações partidárias também deve influenciar diretamente o panorama eleitoral de 2026. A federação entre PP e União Brasil, que reúne dois partidos com forte presença nas regiões Metropolitana, Médio Paraíba e Região dos Lagos, tendo vencido em 30 municípios nas eleições de 2024. Com esse desempenho, a federação superará as 22 prefeituras conquistadas pelo PL e se tornará a principal força municipal do estado. Esse resultado reforça sua capacidade de articulação e estruturação de uma candidatura competitiva ao governo estadual, podendo servir como pilar para alianças de centro-direita, especialmente se convergir com os interesses de lideranças como Rodrigo Bacellar e Thiago Pampolha. A aliança entre o PL e a federação PP-União Brasil faz com que a candidatura de Bacellar seja a que possui a maior capilaridade de prefeituras no estado.
A Federação PSDB-Cidadania elegeu quatro prefeitos, todos do Cidadania: Bernard Tavares, de Carapebus; Valmir Lessa, de Conceição de Macabu; Fabinho, de Iguaba Grande; e Welberth Rezende, de Macaé. Vale registrar que o Cidadania já aprovou a decisão de não renovar essa federação em 2026. Ao mesmo tempo, o PSDB decidiu por uma fusão com o Podemos, Partido que também não elegeu nenhum prefeito no estado em 2022. A Federação PCdoB, PT e PV elegeu apenas três prefeitos, todos do PT: Washington Quaquá em Maricá; Andrezinho Ceciliano em Paracambi; e Fernanda Ontiveros em Japeri. Atuamente, a tendência é de que esses partidos apoiem a candidature de Paes. Já a Federação PSOL-REDE não elegeu nenhum prefeito.
Em síntese, o cenário para 2026 no Rio de Janeiro está dividido em três eixos principais: a centro-esquerda e a centro-direta em torno de Eduardo Paes, a direita em articulação com Bacellar, Pampolha e o PL, e um centro fisiológico que pode se aliar a qualquer dos lados, conforme os incentivos oferecidos em termos de recursos e cargos. A lógica territorial, fortalecida pelo resultado de 2024 e pela reconfiguração no padrão de execução orçamentária, mediante a elevação hiperbólica do montante destinado para emendas parlamentares, é elemento fundamental na formação das coligações e no êxito das candidaturas. A disputa estadual deverá refletir, assim, o novo arranjo político consolidado nos municípios e nas bancadas estaduais e federais, em um contexto de polarização e negociações cruzadas alimentadas pelos vultuosos recursos das emendas parlamentares que, em inúmeros casos, ultraam os orçamentos dos municípios.
Tabela 01: Prefeitos e seus possíveis alinhamentos para 2026.
Região | Município | Prefeito Eleito | Partido | % de Votos | Alinhamento |
Metropolitana | Rio de Janeiro | Eduardo Paes | PSD | 60,47% | Centro |
Metropolitana | São Gonçalo | Capitão Nelson | PL | 84,49% | Direita |
Metropolitana | Niterói* | Rodrigo Neves | PDT | 57,20% | Centro-esquerda |
Metropolitana | Duque de Caxias | Netinho Reis | MDB | 54,08% | Centro |
Metropolitana | Nova Iguaçu | Dudu Reina | PP | 74,77% | Direita |
Noroeste | Itaperuna | Nel | PL | 43,14% | Direita |
Noroeste | Miracema | Alessandra | Republicanos | 48,90% | Direita |
Norte | Campos dos Goytacazes | Wladimir Garotinho | PP | 69,11% | Direita |
Norte | Macaé | Welberth Rezende | Cidadania | 85,60% | Centro |
Baixadas Litorâneas | Cabo Frio | Dr. Serginho | PL | 69,19% | Direita |
Baixadas Litorâneas | Arraial do Cabo | Marcelo Magno | PL | 75,85% | Direita |
Serrana | Petrópolis* | Hingo Hammes | PP | 74,74% | Direita |
Serrana | Nova Friburgo | Johnny Maycon | PL | 64,99% | Direita |
Centro-Sul | Três Rios | Joa | Republicanos | 60,99% | Direita |
Centro-Sul | Paraíba do Sul | Júlio Canelinha | União Brasil | 54,48% | Centro-direita |
Médio Paraíba | Volta Redonda | Neto | PP | 72,84% | Direita |
Médio Paraíba | Barra Mansa | Luiz Furlani | PL | 48,10% | Direita |
Costa Verde | Angra dos Reis | Cláudio Ferreti | MDB | 42,41% | Centro |
Costa Verde | Paraty | Zezé Porto | Republicanos | 54,20% | Direita |
* cidades onde houve segundo turno
Tabela 02: Deputados e seus possíveis alinhamentos para 2026
Nome | Cargo | Partido | Votos | Alinhamento | Base Territorial Principal |
Daniela do Waguinho | Federal | União Brasil | 213706 | Centro-direita | Belford Roxo (Baixada Fluminense) |
General Pazuello | Federal | PL | 205324 | Direita | Zona Oeste do Rio / Militar |
Talíria Petrone | Federal | PSOL | 198548 | Esquerda | Niterói e São Gonçalo |
Doutor Luizinho | Federal | PP | 190071 | Centro-direita | Nova Iguaçu |
Altineu Côrtes | Federal | PL | 167512 | Direita | São Gonçalo |
Tarcísio Motta | Federal | PSOL | 159928 | Esquerda | Zona Norte / Centro do Rio |
Otoni de Paula Jr. | Federal | MDB | 158507 | Direita | Zona Oeste do Rio |
Lindbergh Farias | Federal | PT | 152219 | Esquerda | Nova Iguaçu e Duque de Caxias |
Gutemberg Reis | Federal | MDB | 133612 | Centro-direita | Duque de Caxias |
Hélio Lopes | Federal | PL | 132986 | Direita | Baixada Fluminense / Militar |
Márcio Canella | Estadual | União Brasil | 181274 | Centro-direita | Nova Iguaçu |
Douglas Ruas | Estadual | PL | 175977 | Direita | Baixada Fluminense |
Renata Souza | Estadual | PSOL | 174132 | Esquerda | Complexo da Maré / Zona Norte |
Rosenverg Reis | Estadual | MDB | 131308 | Centro | Duque de Caxias |
Dr. Serginho | Estadual | PL | 123739 | Direita | Cabo Frio e Região dos Lagos |
Guilherme Delaroli | Estadual | PL | 114155 | Direita | Itaboraí e São Gonçalo |
Thiago Gagliasso | Estadual | PL | 102038 | Direita | Barra da Tijuca e Zona Oeste |
Rodrigo Bacellar | Estadual | PL | 97822 | Direita | Campos e Noroeste |
Elika Takimoto | Estadual | PT | 95263 | Esquerda | Zona Oeste do Rio |
Giselle Monteiro | Estadual | PL | 92028 | Direita | Região Serrana |
1 Disponível em: https://outraspalavras.net/estadoemdisputa/eleicoes-no-rio-reflexoes-para-2026/
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O governador do Rio, Claudio Castro (PL), e o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD) Foto: Arquivo