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Um agricultor peruano, Saúl Luciano Lliuya, foi até a justiça alemã para acionar a empresa (também alemã) de energia alemã RWE, pelo impacto causado pelas emissões de suas termelétricas a carvão sobre as geleiras andinas. Em 2015, Saúl Luciano Lliuya pediu indenização alegando que sua casa está em risco de inundação por conta das mudanças climáticas. O juiz entendeu que o valor da causa não era suficiente para levar o processo adiante, segundo a agência Reuters. Ao rejeitar o processo, porém, o Tribunal Regional Superior de Hamm itiu a responsabilidade de empresas de combustíveis fósseis sobre os prejuízos relacionados ao clima.
A decisão foi celebrada como uma vitória por organizações do direito ambiental que apoiaram o agricultor e o povo de Huaraz, fundado no século 17, situado a mais de três mil metros de altitude nos Andes do Peru, na obtenção desta importante decisão. Ela envia um sinal poderoso: a pressão sobre o modelo de negócios dos combustíveis fósseis aumentou.
O juiz reconheceu, por exemplo, que já que as mudanças climáticas são globais, a distância entre as operações da RWE na Alemanha e a propriedade de Saúl no Peru não isenta o poluidor da responsabilidade.
“Pela primeira vez, um tribunal europeu afirmou que as vítimas do clima podem buscar justiça — e os poluidores podem ser responsabilizados legalmente. Este precedente fornece um impulso legal para acelerar a busca por justiça climática, observou o advogado sênior do Centro de Direito Ambiental Internacional (CIEL), Sébastien Duyck.
Ele destaca que a decisão do tribunal é um alerta para mercados financeiros e formuladores de políticas públicas, que precisam reavaliar os riscos associados às emissões de gases de efeito estufa. O litígio climático contra instituições públicas e organizações privadas ganhou impulso nos últimos anos, como uma estratégia encontrada pela sociedade civil para pressionar mudanças nas políticas públicas e de investimento.
É uma forma de mostrar também que o Estado está falhando em cumprir o seu papel de zelar pela saúde e bem-estar das pessoas e do meio ambiente.
Levantamento do Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment mostra que entre a ratificação do Acordo de Paris (em 2015) e o final de 2023, pelo menos 230 ações judiciais relacionados a questões climáticas foram movidas contra empresas em diversos países. Mais de dois terços desses processos ocorreram a partir de 2020 e mais de 140 estão relacionados ao greenwashing – quando uma organização se diz comprometida com o clima, mas a prá ;tica demonstra o contrário.
Em muitos dos casos, as grandes corporações saem vencedoras como a RWE e a Shell, no final de 2024, com seu recurso contra tribunal holandês que obrigou corte de emissões. Mas para as organizações da sociedade civil envolvidas nessa agenda, o próprio julgamento já traz repercussões capazes de colocar, no mínimo, uma pulga atrás da orelha de investidores na hora de analisar os riscos de um projeto.
No Brasil, as campanhas da Petrobras e do governo Lula para explorar petróleo na Foz do Amazonas e extrair gás não convencional via fraturamento hidráulico (fracking) entraram na mira de ambientalistas e do Ministério Público Federal (MPF).
No último dia 28, o Instituto Arayara apresentou um conjunto de cinco ações civis públicas para excluir 68% dos blocos do leilão de concessão, marcado para 17 de junho. Elas serão destinadas aos tribunais federais do Pará, Brasília, Mato Grosso, Paraná e Rio Grande do Norte, a depender do setor.
Uma dessas ações inclusive cobra transparência climática e questiona a falta de estimativas públicas das emissões de gases de efeito estufa (GEE) associadas aos blocos ofertados.
O anúncio das ações ocorreu na sequência de uma recomendação do MPF para exclusão dos 47 blocos na bacia da Foz do Amazonas do leilão marcado para 17 de junho. Procuradores da República do Estado do Pará chamam a atenção para a dificuldade de licenciamento do bloco FZA-M-59, o indeferimento da licença pelo Ibama e a elevada sensibilidade ambiental.
Publicado em julho de 2024,o Panorama da Litigância Climática no Brasil mostra que, até março daquele ano, o país registrava 80 ações – o quarto país no ranking global em número de processos do tipo, atrás apenas de Estados Unidos, Austrália e Reino Unido.
A imagem que abre este artigo mostra operários nas obras para COP30 Brasil Amazônia, na Cidade de Belém, no Pará. (Foto: Rafa Neddermeyer/COP30 Brasil Amazônia/PR).